terça-feira, 29 de julho de 2008

Vozes Gravadas na Pedra

Sento-me nos degraus da grande entrada da Catedral de Santa Maria em Évora. Sobre mim as doze preciosas esculturas com os apóstolos. Estranhas figuras. Cada uma olha num sentido diferente. Para onde se dirigem os seus olhares? Encontramos apóstolos de várias raças, negros, árabes, hebreus. Que mensagem teriam os escultores medievais querido deixar ao futuro esculpindo as imagens dos apóstolos de Cristo num registo tão diferente de todas as outras representações?
Soterrada nas fundações da catedral estará o que resta da grande mesquita de Évora. Gerações e gerações de culturas ergueram os seus templos naquele mesmo lugar. Mas hoje, o que nos fica é a romano-gótica Catedral dedicada a Santa-Maria que dentro da igreja podemos encontrar por duas vezes em estátuas onde está sempre representada grávida: a Senhora do Ó.
Todos os degraus da escadaria principal estão gravados com misteriosos símbolos: esquadro, nível, prumo, assinaturas encriptadas, marcações das passagens solsticiais. Mesmo abaixo do olhar dos apóstolos, em Pedras Cúbicas e Polidas, os Mestres da Grande Construção Operativa dos Templos deixaram subtis sinais para que fossem reconhecidos por outros que ao chegar e sendo detentores dos segredos dos seus significados se soubessem guiar no gigantesco projecto de construção de «Santa-Maria».
À entrada da catedral eis os sinais deixados ao futuro pelos Maçons, que ao trabalharem nas partes inferiores da edificação, confiavam que mesmo depois da sua morte outros viriam e continuariam, pedra a pedra, a construção até que no zénite do edifício a flecha da catedral flamejasse sobre a cidade.

Cá fora o calor aperta. Quarenta graus. Num movimento lento percorro as marcas gravadas com os dedos. Os símbolos parecem despertar sob as minhas mãos. Com surpresa, descubro um pequeno sol e uma lua. Percorridos todos os sinais da escadaria diríamos estar preparados para dar entrada no templo. Estaremos? A porta abre-se, ao fundo, sobre o altar, um triângulo radioso com um olho pintado. Não somos nós que o olhamos mas «ele» que nos olha.
Mais uma vez, pelo chão, mais sinais gravados fazem-nos baixar a cabeça. Como se cegássemos. Vinda do interior da terra uma voz faz-se ouvir: «Que queremos para este nosso irmão?» depois de uma pausa, olhando de novo o triângulo, outra voz se ergue dos Elementos: «A Luz!».

Autor: Hugo Pratt

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