terça-feira, 27 de novembro de 2012

Fernando Valle

Médico, maçon e político português, Fernando Baeta Cardoso do Valle nasceu a 30 de Julho de 1900, em Cerdeira, no centro de Portugal, e morreu a 27 de Novembro de 2004, em Coimbra, aos 104 anos.

Fernando Valle pertencia a uma família abastada, uma família de médicos com ideais republicanos, que, quando ele tinha dois anos, se mudou para Côja, no concelho de Arganil, onde iria passar toda a sua vida e a exercer medicina.
Aos 23 anos, tornou-se maçon ao entrar para o Grande Oriente Lusitano através da Loja "Revolta". Escolheu para nome de iniciado Egas Moniz, por este ser para si um exemplo de lealdade.
Após a instauração do Estado Novo tornou-se opositor do presidente António Oliveira Salazar, personalidade que considerava "uma coisa má" para Portugal. As suas opções políticas levaram a que, em 1949, fosse demitido do posto de médico municipal, tendo sido acusado de ser desafecto ao regime. Isto porque participou na campanha presidencial de Norton de Matos. Mesmo assim, em 1958, apoiou a candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República.
Ingressou ainda nas Juntas de Acção Patriótica, o que levou a que fosse preso, entre 27 de Abril e 29 de Junho de 1962, na Cadeia do Aljube.
Já em 1971, o regime, então liderado por Américo Thomaz e Marcello Caetano, tentou afastá-lo do Hospital da Misericórdia de Arganil. No entanto, uma manifestação de mulheres foi organizada para impedir que tal sucedesse e o afastamento de Fernando Valle foi evitado.

Da sua actividade cívica destaca-se, entre outras, a fundação da Sociedade Recreativa Argus, de que resultou mais tarde a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Argus, juntando todas as associações existentes em Arganil.

Fernando Valle manteve-se sempre ligado à política e, em Abril de 1973, participou, de forma clandestina, na reunião fundadora do Partido Socialista (PS). O encontro decorreu em Bad-Munstereifel, na Alemanha, e contou também com a presença de Mário Soares.
Apesar de ter continuado ligado ao PS até à data da sua morte, Fernando Valle recusou sempre cargos políticos. Só abriu uma excepção para ser governador-civil de Coimbra, um cargo que desempenhou entre 1976 e 1980 e logo após a «Revolução dos Cravos» foi presidente da comissão administrativa da Câmara Municipal de Arganil.

Fui galardoado com a Ordem da Liberdade (Grande Oficial) e Ordem de Mérito (Grã-Cruz).
 
Após falecer a 27 de Novembro de 2004, Fernando Valle foi sepultado em Côja, tendo assistido ao funeral várias personalidades das mais diferentes áreas culturais, cívicas e políticas.

Sentido voto de pesar aprovado por unanimidade na Assembleia da República

Após ter heroicamente resistido até aos 104 anos, faleceu o Dr. Fernando Valle. 

Deixou-nos um cidadão, um homem e um profissional que atravessou o último século e pôde testemunhar ainda os primeiros anos do século presente. Raros seres humanos terão deixado, após si, a imagem de bondade, solidariedade, amor pelo semelhante, nobreza de carácter, coragem cívica e dignidade em todos os actos da sua vida que Fernando Valle nos deixou.

Foi um médico distinto, que exerceu a medicina como um sacerdócio. Foi talvez o exemplo mais frisante, se não único, do médico que empobreceu a exercer medicina. Aluno brilhante da Universidade de Coimbra, renunciou à possibilidade de uma carreira académica para curar doentes em Arganil, Coja, e outras povoações da serra do Açor. De dia e de noite, chovesse ou soprasse o vento, a pé ou a cavalo, lá ia o Dr. Fernando Valle aonde o chamassem para curar doentes, fazer partos, pequenas cirurgias ou mesmo curar almas, que tudo isso tinha de saber fazer o médico de família de então. 
Não levava dinheiro a quem o não tinha. O mais das vezes prodigalizava os medicamentos. Se os não tinha, deixava, não raro, à cabeceira do doente o necessário para comprá-los.
 
Nos intervalos da profissão, exerceu sempre uma corajosa acção cívica de oposição à ditadura, batendo-se pela liberdade e pela democracia. Por isso foi preso e perseguido.

Membro do Grande Oriente Lusitano, do qual, por modéstia, nunca quis ser Grão-Mestre, era, ao morrer, o mais antigo maçon do mundo. E decerto um dos mais fiéis e permanentes intérprete dos valores por ele perfilhados. Viveu toda a sua vida, sincera e convictamente, em consonância com eles.

Fundador do Partido Socialista, e há alguns anos seu Presidente Honorário, viveu o socialismo como ele deve ser vivido: como um humanismo. E fez da sua vida uma das referências mais exemplares para quem busca a perfeição cívica e ética. Viveu verdadeiramente como um santo laico.
Deixa-nos uma maravilhosa recordação. Tentemos imitá-lo e merecê-lo.

Na sua reunião de 2 de Dezembro de 2004, a Assembleia da República aprovou um sentido voto de pesar, endereçando à família enlutada, ao Partido Socialista e à legião de admiradores do Dr. Fernando Valle o seu mais sentido pesar.


Autor: Júlio Verne

terça-feira, 13 de novembro de 2012

O Internato S. João - Lisboa e Porto

O Asilo S. João, instituição de beneficência criada em Lisboa em 1862, pela Maçonaria, mais rigorosamente pela Confederação Maçónica Portuguesa, cujo Grão-Mestre era José Estevão Coelho de Magalhães, a fim de receber 20 raparigas que se achavam recolhidas no Asilo dos Cardais de Jesus, dependente das Irmãs de S. Vicente de Paulo (Irmãs da Caridade) e que, com a expulsão destas de Portugal, tinham ficado ao abandono. 


Pertença sempre da Maçonaria, foi obtendo importantes doações de beneméritos, entre eles, o edifício onde hoje está instalado na Travessa do Loureiro, n.º 8 da numeração actual, outrora n.º 10. 


O número de asiladas, todas elas órfãs, chegou a atingir 80 raparigas, proporcionando-se-lhes, até à idade de 18 anos, alimentação, vestuário, educação laica, incluindo instrução literária, trabalhos manuais e ensino profissional. 



No Porto, é também criado pela Maçonaria, em 1891 a instituição de beneficência Asilo de S. João, na Rua da Alegria, n.º 342, a fim de receber rapazes órfãos.
 
São hoje Internatos de S. João, mantêm a sua actividade quer no Porto, quer em Lisboa com os mesmos fins e propósitos da sua criação, acolhendo crianças em riscos, dando-lhe abrigo, educação e preparando-as para a inserção na sociedade e na vida activa.

In Dicionário de Maçonaria Portuguesa - A. H. de Oliveira Marques

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A Biblioteca do Grémio Lusitano

A Biblioteca do Grémio Lusitano foi fundada em 1873, numa das salas do Grémio quando ele estava instalado na Rua Nova do Carmo, passando em 1880 para a sede actual, no Palácio Maçónico. Foi organizada por Henrique Jerónimo de Carvalho Prostes (1844 – 1890), jornalista e escritor, cônsul de Portugal no Sião e em Génova, onde morreu.
Como então informava o Boletim do Grande Oriente Lusitano Unido – Supremo Conselho da Maçonaria Portuguesa, «os irmãos estudiosos e aqueles que verdadeiramente se interessam pelos destinos desta instituição universal, poderão já ali encontrar um avultado número de subsídios para enriquecer o seu espírito» (nº 6, II Série, Setembro de 1873, p. 94).

Foi enriquecida ao longo do tempo – o próprio Boletim dava conta de muitas das publicações recebidas – mas também conheceu diversas vicissitudes, ao sabor da situação política. Os assaltos, pilhagens e destruições que o Palácio Maçónico sofreu durante o sidonismo e após o 28 de Maio de 1926, culminando com a proibição da Maçonaria, em 1935, a dissolução do Grémio Lusitano e a espoliação dos seus bens, afectaram-na dramaticamente, acabando por liquidá-la e por dispersar o seu espólio.

No entanto, depois do 25 de Abril de 1974 foi possível recuperar muitos dos livros que tinham sido confiscados e depositados no ministério das Finanças. Também se tem registado diversas doações e aquisições que muito a enriqueceram.

Dessa forma, a actual Biblioteca, para além de bibliografia geral e de temáticas afins, é constituída por um fundo considerável de obras maçónicas portuguesas, antigas e modernas: monografias, publicações periódicas, folhetos e panfletos, dos séculos XIX e XX. 
Também existem muitas obras estrangeiras, a partir do século XVIII, com destaque para boletins, revistas e anuários de Obediências de todos os continentes com as quais o Grande Oriente Lusitano mantinha relações, e que constituem um acervo único em Portugal e pouco vulgar no mundo.  
Fazem ainda parte da Biblioteca várias obras portuguesas e estrangeiras mais modernas.
In Dicionário de Maçonaria Portuguesa - A. H. de Oliveira Marques