terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O Símbolo e o Templo

Em jeito de proclamação maçónica: Temos consciência do muito pouco que sabemos. Queremos saber mais – é a primeira Luz. Queremos saber, como os nossos Irmãos querem. Queremos alcançar, por revelação simbólica, o que não conseguimos até agora. E conseguiremos? Alguém de todo conseguiu?
Todos nós, Irmãos, temos de comum, o querer construir o nosso Templo, como templo perfeito, o que é acto de Sabedoria e de Força. A essência da Maçonaria está na procura. Mas na procura pensada, e harmónica, o que é acto de Beleza. E para a procura, o meio é o Símbolo e o fim é o Templo – o nosso templo – que vamos construindo, transformando a pedra bruta em pedra cúbica. Este o princípio e o fim.

O Humano, o ser humano desumaniza-se naturalmente com a vida. Os valores que, como na natureza, de si brotavam no início, foram sendo, primeiramente contrariados e depois tendencialmente substituídos por outros, de menor exigência e por fim, erradicados. O Mundo dos Valores é vítima, quase indefesa. Pensamos no entanto que, mesmo submerso, o nosso Mundo dos Valores tem memória, pequena embora. E é dessa memória – notável bóia de salvação do homem - que alguns partem para a Luz. E por via dessa Luz, o Mundo dos Homens Justos e de Bons Costumes está à nossa mão. O nosso Templo está em construção, sólida.

Decididamente diremos que, embora sem o domínio consciente do Segredo, tivemos um momento de sorte – chamamo-lo assim com convicção – quando os Irmãos nos aceitaram na Ordem, porque um amigo nos quis também seu Irmão. Nós, só muito excepcionalmente e sem tal chamamento, teríamos possibilidade de partilha de valores e auscultar tão criticamente a nossa consciência, como agora o fazemos na nossa Viagem Maçónica. Agnósticos como somos, fiéis à matéria e aos sentidos, nada crentes no além e nos Deuses, convictos que é aqui que os Homens se compensam porque só aqui vivem e aqui esgotam a vida, diremos com plena certeza, no Final da Vida, que vivemos felizes porque maçons. Doutro modo, morreremos espiritualmente confortados, após uma vida feliz, porque maçons. Ou doutro modo ainda: - Pedreiros Livres, Livres Pensadores, trabalhadores do Templo que não se acabou – nunca se acaba porque os valores mudam – morreremos compensados porque Maçons.
 
A linguagem maçónica é simbólica. O símbolo é a expressão, as mais das vezes, do indizível. O símbolo é síntese. Começamos esta parte da prancha com afirmação de louvor, por alguns ensinamentos da obra “Maçonaria - Raízes e Segredos da Sua História” de Wilmshurst, que faz uma alusão aos compiladores das pranchas de Iniciação, associadas a cada grau da Maçonaria. Diz então que as ditas pranchas, “pretendem expor a doutrina do sistema e interpretar os símbolos e rituais. Mas estas pranchas – continua a dizer – necessitam duma interpretação. Na verdade, não são concebidas com grande astúcia e sigilo. Os seus compiladores foram confrontados com a dupla tarefa de dar uma expressão fiel da doutrina esotérica, se bem que parcial, encobrindo-a ao mesmo tempo para que o seu sentido lato não fosse compreendido sem algum esforço e esclarecimento e transmitisse pouco ou nada aos não merecedores ou imaturos para a Gnose ou para o ensino da Sabedoria. Eles desempenharam essa tarefa com notável sucesso e de uma forma que provoca admiração daqueles que podem apreciá-lo devido ao seu profundo saber...”. 
Isto dito, para concluir que os rituais dos vários graus, resultaram de compilações, levadas a efeito por quem conhecia a linguagem simbólica e o ritual ou rituais que a complementam; que foi tudo feito, encobrindo-se aos profanos a luz e iluminando os Irmãos, o que revela o carácter esotérico da mesma linguagem e rituais.

As referências escritas que fizemos, leva-nos a concluir que o símbolo maçónico, o ritual, a alegoria, são criações do homem. E como criações do homem, a revelação ou conhecimento intrínseco do símbolo está na directa proporção das capacidades intelectivas de cada um isto é, para uns, certamente que menos dotados ou menos emocionados, o acesso à mudez do símbolo, torna-se mais difícil. Para outros a revelação é menos difícil. Não obstante, estamos decididamente no domínio do terreno, do material, do Homem e das suas virtualidades, sendo que o símbolo é o meio para atingir o fim maçónico - o Templo, ou seja o nosso templo.
 
Pois bem, a dificuldade está, de facto, na construção do Templo perfeito. Para melhor enquadramento, relembramos o Grão-Mestre António Arnaut, na sua obra “Introdução à Maçonaria”, onde escreve: “vejamos pois qual o caminho dos caminhos, onde todos, chamados liberais ou ditos regulares, se possam encontrar, na tarefa, sempre inacabada, de aperfeiçoar a pedra bruta e de Construir o Templo interior”. 
Antes escreveu: “Num tempo despojado de valores éticos morais, dominado por um capitalismo infrene, sem alma nem regras, que enredou o homem em novas e mais sofisticadas servidões, o que pode e deve fazer a Ordem Maçónica para transformar o mundo de selvagem em humano. Há, seguramente, vários caminhos, e todos são válidos se conduzirem a uma sociedade mais justa e perfeita. Mas estou em crer que é no regresso à espiritualidade Maçónica que se construirá o verdadeiro humanismo”. 
De seguida esclarece o sentido dos dois conceitos, escrevendo: “Espiritualidade é o primado dos valores do espírito, da consciência, do ser, em contraposição ao materialismo dominante, ou seja, à ânsia do ter”. 
Eloquentemente escreve de seguida: “Só a descida à nossa consciência, onde jaz a palavra perdida, permite a descoberta do eu absoluto, como dizia Sérgio, e o encontro do outro, como elo da mesma cadeia universal. Humanismo é a doutrina moral que reconhece o homem como fim e como valor superior, na expressão de Sartre, centro do mundo, medida de todas as coisas. Por isso, todas as reformas e conquistas sociais só terão sentido ético se servirem a dignidade do homem e contribuírem para a fraternidade e harmonia colectivas”. O nosso Templo. 
Dito isto, pensamos que estávamos certos quando inicialmente considerámos que o segredo é o Templo, a construção do nosso templo. Templo que é , depósito vivo e emocional do nosso Mundo de valores, da nossa Consciência. Mundo inicialmente puro, depois quase completamente apagado e que num momento de sorte, colhido por uma centelha de Luz, começa o seu trabalho de reconstrução, com Força, Beleza e Sabedoria, elevando valores, e militando na Justiça e nos Bons Costumes. Donde que o Templo seja Princípio e Fim; e também expressão do homem, como valor superior e capaz de, por virtude própria, se elevar. O Templo, o nosso templo, a construção do nosso templo é, em nosso entender, de facto o segredo. O trajecto pensado, não obstante ter sido pensado em português, na nossa língua, leva-nos às sínteses emocionadas que serão de futuro, as âncoras valiosas da nossa consciência. E este trajecto, trabalhado e as mais das vezes emocionante, com símbolos, é de facto irrevelável, até porque e no fundo se perdeu. Ficamos com o produto, pois a viagem não deixou rasto. 

De facto, perguntarmo-nos do processo de aquisição dum valor, que passámos a ter, quando antes, com maior ou menor dificuldade o conseguíamos esquecer, é ficarmos sem resposta. É facto que o valor é hoje nosso e em circunstância alguma o vamos ofender. O porquê desta alteração, conseguiremos justificá-lo mas o trajecto na nossa consciência, esse é indizível, embora tendo acontecido. Numa síntese: O trabalho solitário ou apoiado, teve um resultado, mas o trajecto e o momento da passagem do valor pensado para valor constituído, embora acontecido, é indescritível porque é Segredo da nossa Consciência. E com a constituição de novos valores, nasceu um homem novo, exactamente o Iniciado Maçon; doutro modo, o iniciado encontrou-se com o eu absoluto ou com o outro que ele não era. Para este desiderato, ao maçon foram ensinados símbolos, palavras e toques, para além de ter sido sujeito e objecto da cerimónia de iniciação. 
Com a iniciação o maçon conhece o ritual maçónico e daqui se concluí que a construção do seu templo, passa pela interpretação simbólica e pelo trabalho ritualista, apenas apreensível a quem foi iniciado. A dialéctica interior do maçon, que o leva à construção do seu templo, parte duma proposição que começa por negar, mas a ela chega como valor, usando os símbolos e a sua interpretação, num percurso de grande labor mental, de grande capacidade de análise e já próximo dos homens superiores. Esta dialéctica, que obviamente continua, até ao decesso, é mais ou menos especulativa consoante o conhecimento do símbolo for mais ou menos profundo. Podemos talvez dizer que a maçonaria pode estar, como qualquer ciência, na primeira linha de combate contra a fragilidade humana. Poderemos também entendê-la como a heroína invulnerável e a combatente pela Humanidade dos Direitos e dos Valores.
 
Mas fechemos o círculo da nossa proposição maçónica, o maçon não se esgota na especulação interior pois assume uma postura militante e actuante, de acordo com os valores que constitui. Não é nem pode ser apenas asceta ou filósofo. Atente-se nos caminhos que percorre da Liberdade, Igualdade e Fraternidade bem como da Justiça, Verdade, Honra e Progresso, para concluir que é no Mundo Profano, no Mundo da relação com os outros que o maçon exprime a Riqueza e a Virtude dos Valores que o Iluminaram. Daí que o Sapientíssimo Grão Mestre nos incite, na sua obra referida, às manifestações de exemplaridade cívica, familiar, profissional; à exemplaridade da nossa vida. Pois bem, louvando-nos no entendimento magnífico do Simbolismo maçónico, fixemos que, símbolos nossos são também os próprios Irmãos, quando as suas vidas são verdadeiramente exemplares. 
Assim concluía com o maior louvor: “ O maçon é o mais Solitário dos Solidários”, frase “mágica” do nosso Irmão Espinosa na sessão comemorativa dos 80 anos de maçon do nosso Irmão Fernando Vale.

Autor: Freud

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