Páginas

terça-feira, 12 de março de 2013

Construir a Maçonaria Europeia

Toda a construção, toda a mudança é necessariamente um empreendimento complexo, aventureiro, imprevisível, inquietante e pode ser mesmo perigoso. Mas quem somos? Não somos os herdeiros dos construtores das catedrais? Não aprendemos a arte do traço e da dimensão da pedra bruta? Ignoramos a maneira de ajustar as pedras mesmo as mais dissimilares? 
Nós temos as ferramentas legadas pelos nossos antecessores, os métodos de trabalho, o pensamento e certas fórmulas capazes de nos pôr na via de tal alquimia. Também vos digo, estou optimista: é disto que vos falo, ou seja da construção de uma maçonaria europeia, está sob os nossos olhos, em redor do pavimento de mosaico: Os Imãos e as Irmãs franceses, portugueses, belgas e mesmo brasileiros! Ritos e Obediências, fortemente diferentes e no entanto capazes de se reunir para trabalhar juntos!!! Não duvido que o que podemos fazer uma vez, poderemos efectivamente faze-lo outras vezes. Tal pode tornar o nosso encontro exemplar, embora não seja uma excepção.

Assisti na Europa a iniciativas semelhantes. Penso, por exemplo nos encontros anuais organizados pelas R. L. Hiram do Rito Francês, GODF e Withe Swan do REAA, GLDF, ambas a Oriente de Londres; A RL Estrela D’Alva, programou para Lisboa, um Encontro sobre o tema da «cidadania na Europa»: um projecto que deverá reunir as Lojas portuguesas naturalmente, mas também as francesas, espanholas, brasileiras e belgas, sem distinção de Rito, Obediência ou de sexo. Penso nos projectos programados pela R. L. Cosmodicée com a sua Loja gémea em 2015 em Mons, os quais St Jean subscreve totalmente. 


Sublinhou bem VM, que em cada uma das vezes estas iniciativas germinaram na estrutura elementar da Ordem Maçónica, isto é, na LOJA! Por ser no interior da Loja e a partir dela que se construíram e se constroem ainda, todos os projectos duradouros e bem fundados. Sendo, ainda, dentro da Loja, que se operam as transformações da matéria, seja íntima ou não, individual ou colectiva… Sendo a partir da Loja e de nenhum outro lugar que chegamos e chegaremos a levar para o exterior do Templo o que aprendemos aqui. 
Sabemos, porque o praticamos, direi que diariamente. O Oriente de Tours é deste ponto de vista exemplar, dado que 15 Lojas de Ritos diferentes e pertencendo a 5 Obediências, trabalham desde há vários anos em conjunto. Certamente este trabalho é essencialmente administrativo e de gestão material, mas não só. Estas vicissitudes do tipo profano, incontestavelmente favoreceram e mantiveram as relações, as visitas, os projectos e os trabalhos comuns. Penso na associação « laço de união europeia » sonhada pelo nosso saudoso Irmão Paul Bachelard que foi membro da R. L. os Démophiles. Penso igualmente nas iniciativas comuns acerca da laicidade. Mais distante no tempo recordo-me de duas exposições internacionais sobre a maçonaria organizadas em Tours. De maneira mais trivial, mas porque não, penso em certas fraternais actividades e festas locais. Eu mesmo soube recentemente que Irmãos e Irmãs de várias Lojas montaram um grupo musical inter-obediências. Sem procurar muito longe, esta sessão e a presença dos nossos Irmãos portugueses e belgas, só foi possível graças à colaboração das lojas d’Indre-et-Loire e até de outras. Lojas do GODF, mas não só. 
Defendo que é ao nível da Loja e a partir dela só, que a construção europeia será possível. Cabe-nos a nós demonstrá-lo. Claro que não nego que as nossas obediências não tenham tentado trabalhar em conjunto? As três principais Obediências aqui representadas, o GODF, o GOL e o GOB, assinaram tratados, encontram-se, participam em estruturas e delegações comuns. Elas têm a legitimidade e o poder e é bem assim.

Mas faço uma pergunta: porque não se vai além da simples manifestação de princípio acerca de valores comuns, diria pontualmente? No meu entender por duas razões essenciais: A primeira prende-se as nossas histórias respectivas e com o facto de as nossas obediências serem construídas à escala das nações, com a herança das nações e os reflexos das nações!!! Ora, o processo de mundialização, questiona em primeiro lugar as fronteiras das nações!!! Questiona seguidamente as mobilidades que fazem os homens atravessar mais facilmente as fronteiras e poderem encontrar-se longe dos seus Orientes nacionais. Contra isso, as nossas Obediências são actualmente impotentes, e não vejo nada que possa surgir como um começo de resposta da sua parte. Uma resposta que testemunhasse uma transformação e uma adaptação da maçonaria a este novo dado. A segunda razão remete-nos para a questão iniciática. Construir com o Outro, é renunciar a uma parte de si mesmo, é entrar num processo de despojamento para ir ao essencial na humildade e sobretudo no respeito pelo Outro. Nada se pode fazer se não estivermos persuadidos de que não sabemos tudo, que não trazemos toda a Luz só para nós e que a nossa parte de sombra não é menor que a do outro, seja irmão ou irmã. Nós não somos a Ordem. Não, nós ocupamos um lugar, certamente privilegiado, mas igualmente efémero e relativo. 

Tudo isto se consegue do trabalho em Loja! Este conhecimento não existe em nenhum outro lugar ou não é utilizado como tal, ou bem que ainda o é, mas de maneira muito insuficiente. Como disse há pouco, eu não sou pessimista. Será que um dia as nossas Obediências conseguem trabalhar permanentemente juntas e construir de facto a Europa Maçónica que desejamos? Mas primeiro será necessário que os trabalhos anteriormente efectuados pelas Lojas Europeias Livres (e porque não para além da Europa), as lojas compostas de maçons e maçonas livres, tenham favorecido a subida da seiva que verá desabrochar os frutos no cume das nossas árvores respectivas…
Para terminar por agora, vou buscar por minha iniciativa esta citação de Paul Bachelard que concluía um artigo escrito em 2008. «Propor às irmãs e aos irmãos que ponham conjuntamente e em processos mais longos que a anualidade, as suas reflexões e trabalhos sobre os temas essenciais da renovação da nossa sociedade, é pôr em curso uma dinâmica colectiva. A noção de ordem maçónica deve tomar o passo sobre as Instituições gestoras, para se fazer ouvir, a uma só voz, forte, a diversidade e a unidade profunda do humanismo maçónico».

Camille Desmoulins - RL Saint Jean - Oriente Tours - GODF

1 comentário: