terça-feira, 10 de julho de 2007

Sons do Silêncio

Certo dia um rei mandou o seu filho estudar no templo de um grande mestre, com o objectivo de prepará-lo para ser uma grande pessoa.
Quando o príncipe chegou ao templo, o mestre mandou-o sozinho para uma floresta. Ele deveria voltar um ano depois, com a tarefa de descrever todos os sons da floresta. Quando o príncipe voltou ao templo, após um ano, o mestre pediu-lhe que descreve-se todos os sons que conseguira ouvir.
O príncipe disse: - Mestre, pude ouvir o canto dos pássaros, o barulho das folhas, o alvoroço dos beija-flores, a brisa batendo na floresta, o zumbido das abelhas, o barulho do vento cortando os céus...
Quando terminou o seu relato, o mestre pediu ao o príncipe que volta-se à floresta, para ouvir tudo o mais que fosse possível.
Apesar de intrigado, o príncipe obedeceu à ordem do mestre, pensando: "Não entendo, eu já distingui todos os sons da floresta..."
Por dias e noites, ficou sozinho, ouvindo, ouvindo, ouvindo...mas, não conseguiu distinguir nada de novo, além daquilo que havia dito ao mestre.
Porém, certa manhã, começou a distinguir sons vagos, diferentes de tudo o que ouvira antes. E quanto mais atenção prestava, mais claros os sons se tornavam. Uma sensação de encantamento tomou conta do rapaz. Pensou: "Esses devem ser os sons que o mestre queria que eu ouvisse..."
Sem pressa, ficou ali, ouvindo, ouvindo, pacientemente. Queria ter a certeza de que estava no caminho certo.
Quando voltou ao templo, o mestre perguntou-lhe que mais conseguira ouvir.
Paciente e respeitosamente, o príncipe disse: - Mestre, quando prestei atenção, pude ouvir o inaudível som das flores se abrindo, o som do sol nascendo e aquecendo a terra, o som da floresta a beber o orvalho da noite...
O mestre sorrindo, acenou com a cabeça, em sinal de aprovação, e disse: - Ouvir o inaudível é ter a calma necessária para se tornar uma grande pessoa.

Nesta fábula, fica como moral da história, que apenas quando se aprende a ouvir o coração das pessoas, os seus sentimentos mudos, os seus medos não confessados e as suas queixas silenciosas, uma pessoa pode inspirar confiança ao seu redor, entender o que está errado e atender às reais necessidades de cada um.
A morte do espírito começa quando as pessoas ouvem, apenas, as palavras pronunciadas pela boca, sem atentarem no que vai no interior das pessoas para ouvir os seus sentimentos, desejos e opiniões reais.
É preciso, portanto, ouvir o lado inaudível das coisas, o lado não mensurado, mas, que tem o seu valor, pois é o lado mais importante do ser humano.

Autor: Júlio Verne

1 comentário:

Anónimo disse...

Estava a poucos minutos de ir dormir e apeteceu-me ler algo que me levasse mais além do mundo onde estava nesse momento. Cada vez entramos mais numa era de “trevas científicas”, antes os dogmas eram impostos pela Igreja e agora são postos pela Ciência.
Estamos cada vez mais distantes de saber ouvir com o coração, e até mesmo quando pensamos que sabemos ouvir tudo, que sabemos ouvir todos os sons, que sabemos ouvir absolutamente tudo, falta ouvir talvez o mais importante… falta saber ouvir o silêncio…
Somos mais que seres bio-psico-sociais… Não sei bem ao certo como definir a dimensão do ser humano que falta, não tenho nome para ela… mas somos algo mais…

Ricardo