terça-feira, 2 de outubro de 2012

Díógenes de Sínope - Um nome simbólico

«Devemos ter amigos que nos ensinam o bem; e perversos e cruéis inimigos, que nos impeçam de praticar o mal.»
 
«Os piores escravos são aqueles que estão servindo constantemente as suas paixões.»

Diógenes de Sínope, o mais famoso filósofo cínico, não nasceu em Atenas ou Corinto, cidades em que passou, no entanto, grande parte da sua vida. Não era pois um cidadão dessas importantes cidades-estado da Grécia clássica, mas viveu nelas como um exilado. Diógenes viveu entre 404 ou 412 e 323 a. C. Era originário duma cidade do Mar Negro, Sínope, ainda hoje importante urbe costeira do norte da Turquia.  
Tendo-se exilado da sua pátria por motivo do crime de falsificação de moeda segundo alguns - mas conforme outras notícias teria sido o seu pai o autor desse crime - viveu sobretudo em Atenas e em Corinto, duas importantes cidades-estado da Grécia clássica. Tendo aderido às ideias de Antístenes, que fora discípulo de Sócrates e é muitas vezes considerado o fundador da escola cínica, Diógenes é frequentemente lembrado por durante o dia ter sido visto nas ruas de Atenas, de candeia na mão à procura de um homem; ou pelo episódio do seu encontro com Alexandre da Macedónia que o convidou a pedir-lhe o que quisesse, ao que o filósofo lhe terá respondido: «Não me tires o que não me podes dar, a luz e o calor do sol»; ou ainda por, conforme as notícias que nos deixaram aqueles que colecionaram os seus ditos, viver num tonel que constituiria a sua casa, rodeado de cães. Deste animal (em grego kunós, significa cão) derivaria o nome da escola filosófica – se é que o Cinismo não é sobretudo um modo de vida muito mais do que uma escola filosófica. O cão seria mesmo considerado pelos filósofos cínicos um modelo natural a imitar na concretização da ideia de «viver conforme a natureza» que é um dos objetivos do cinismo clássico, filosófico.
Diógenes viveu durante um período conturbado da vida da Grécia antiga – na época da crise da polis (cidade). Embora usando uma língua comum, tendo a mesma religião e dois livros que os uniam, os Poemas Homéricos, as cidades-estado gregas travavam constantes guerras entre si, só interrompidas pelos vários jogos e as suas curtas tréguas - os Olímpicos e outros. A polis que fora durante séculos o espaço da realização da civilização grega, em consequência das lutas intestinas constantes acabou por decair sendo a Grécia conquistada pelo seu vizinho do norte – a Macedónia. É neste período de decadência da polis grega que surge a filosofia cínica de que Diógenes é seguramente o mais conhecido representante.

O vocábulo cinismo está hoje absolutamente desclassificado. Por cinismo entende-se algo de negativo – um cínico é em princípio entendido como alguém insensível que se ri das desgraças dos outros, que ridiculariza valores comummente aceites, que manifesta desprezo pelo sofrimento e dificuldades existenciais do comum dos homens. Chamamos a este tipo de atitude cinismo vulgar e comum.
Não era assim o cinismo clássico – os filósofos cínicos da Grécia do século IV A. C., contemporâneos de Sócrates - falo daquele que bebeu a cicuta - e de Platão, o que pretendiam, e não era pouco, era evitar o sofrimento, adquirir o domínio da paixões e dos desejos, numa palavra, a autarquia, a liberdade e a independência face às necessidades, na medida em que estas, se não satisfeitas, eram motivo de sofrimento. Aquilo que visavam era uma ascese e um domínio tal do império das necessidades que elas não dessem origem à dor – viver conforme à natureza sem o peso dos constrangimentos da vida social, da cidade, da polis, e da cultura, na medida em a não satisfação dessas necessidades artificiais era um motivo de dor. Viver de acordo com a natureza (physis, em grego) é assim um claro ideal do cínico clássico. Não espanta pois que os animais surjam nesta visão dialética da natureza, vista positivamente, e da cultura considerara negativamente, como modelos a imitar e entre os animais de valorize o cão, a que se liga o nome da escola cínica.

Esta posição filosófica envolvia claramente uma crítica da vida social, do homem essencialmente entendido como “animal político”, tese fundamental da Política de Aristóteles. Ao mesmo vemos aqui um anúncio da crítica posterior de Rousseau e da sua ideia do Bon sauvage e até mesmo da crítica de Nietzsche ao homem do rebanho conceito ou quase-conceito que usava para nos dar conta de como concebia o homem europeu plasmado a partir das influências do Judaísmo e do Cristianismo.
É ainda um aspeto importante da doutrina cínica a defesa do cosmopolitismo, a negação do particularismo político grego e o apelo à ideia de um homo universalis, afirmação avant la lettre , no meu entendimento, das ideias de fraternidade e de igualdade.

Por estas últimas ideias, e pelo apelo à valorização do ser em oposição ao império do ter, pelo convite a uma mudança de vida contida no cinismo e nos ensinamentos de Diógenes de Sínope, não vejo que seja um exagero o ter-me proposto como nome simbólico o deste filósofo. E embora se possam encontrar no ideal maçónico pontos de desacordo com o cinismo, não se podem negar, na minha perspetiva, confluências que justifiquem a escolha que fiz.

Autor: Díógenes

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