Há indicações de que o homem primitivo desde cedo soube relacionar o dia com o Sol e a noite com a sua ausência, e nos casos dos povos que viviam mais afastados do equador, decerto distinguiriam duas épocas principais ao longo do ano, uma de frio e outra de calor. Estes conceitos ter-lhe-ão servido não só como base para organizar as suas diversas actividades, mas também dado origem aos cultos solares, com o Sol, a nossa grande fonte de calor e de luz, a ser proclamado como “rei dos céus” e “soberano do mundo”. Estes primeiros conceitos religiosos deverão ter tido influência marcante sobre todas as religiões e crenças posteriores.
Por outro lado, desde os tempos das antigas civilizações, o homem imaginou os solstícios como aberturas opostas do céu, semelhantes a portas, por onde o Sol entrava e saía, ao terminar o seu curso, em cada ciclo tropical.
No panteão romano, a personificação de tal conceito foi o deus Janus, representado como uma divindade bifásica; o seu próprio nome mostra essa implicação, já que deriva de «janua», palavra latina que significa “porta”. Por isso, ele era também conhecido como Janitur, ou seja, porteiro, sendo representado com um molho de chaves na mão simbolizando ser ele o guardião das portas do céu. Posteriormente, essa alegoria passaria, através da tradição popular cristã, para São Pedro, mas já sem qualquer relação com os solstícios.
Janus era um deus bicéfalo, com duas faces simetricamente opostas. Tal representação simbolizava a ideia de que estaria a olhar com uma das faces para o passado e com a outra para o futuro.
Os solstícios ocorrem cerca de 21 de Junho e de 21 de Dezembro e correspondem aos pontos em que vemos o Sol mais afastado da vertical do equador. Os paralelos terrestres em que nessas datas o Sol, ao meio-dia, é visto na vertical recebem respectivamente os nomes de trópico de Câncer e de trópico de Capricórnio, apesar de actualmente nada terem a ver com as constelações do mesmo nome.
Desde há milhares de anos que os mais diversos povos assinalam os solstícios como datas importantes. Nuns casos as celebrações revestiam-se de carácter festivo, enquanto noutras as cerimónias mostravam preocupação. É o caso dos Incas que vendo o Sol cada vez mais a norte no solstício de Junho, receavam que não regressasse e imploravam-lhe que retrocedesse.
Com o tempo, essas tradições terão sido influenciadas e assimiladas pela Igreja, tendo acabado por se confundir. É o caso do solstício de Junho, pois ocorre em data muito próxima da comemorativa de São João Baptista (24 de Junho). Mas onde essa conjugação é mais evidente é na celebração do solstício de Dezembro, que se confunde não só com as festividades de S. João Evangelista (27 de Dezembro), mas em especial com as do dia de Natal (25 de Dezembro).
Autor: Carl Sagan
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