Quando fui instalado na nossa loja no cargo de Guarda Interno, tentei, digamos que por dever de ofício, estudar a função e os deveres que me ficaram confiados. Surpreendentemente, constatei que é o único cargo em Loja ao qual o Regulamento não estipula qualquer função, pelo menos expressamente.
Tive, pois, de recorrer a
outras fontes, tendo ficado surpreendido com algumas descobertas que fiz, pelo
que venho partilhá-las com os meus queridos irmãos.
Aprendi desde logo que é ao
Guarda do Templo que se confia preponderantemente a eficácia do 15º Landmark:
nenhum visitante desconhecido aos irmãos de uma Loja pode ser admitido a
visitar, sem que antes de tudo seja examinado, conforme os antigos costumes.
Ora, se na maçonaria
operativa cabia aos guardas do Templo zelar para que ninguém perturbasse a
sessão (e daí o porte das espadas e a sua presença na joia representativa do
cargo), na maçonaria especulativa o Guarda Interno, ou simplesmente o Guarda do
Templo (dada a ausência de Guarda Externo) limita-se a dar entrada aos irmãos
que chegam após a abertura dos trabalhos, para além do ritual em que informa o
Primeiro Vigilante que o Templo está coberto, ajudando-o assim no seu primeiro
dever.
Não obstante, a função não é despicienda, e é muitas vezes entregue ao Venerável Mestre que sai (embora não no mandato logo subsequente, em que deve ocupar o lugar de past-Venerável, à direita do novo Venerável, como sinal de solidariedade e ajuda, pondo a sua experiência ao serviço do auxílio ao novo Venerável, alegadamente inexperiente), mas logo no mandato seguinte, se a Loja dele não carecer para outro cargo. Há quem refira que ao ir ocupar este cargo, pretensamente subalterno, está a sinalizar a humildade que todo o bom maçon deve possuir, mas a verdade é que também, em certas circunstâncias, é necessária uma profunda experiência e um grande conhecimento do ritual para (quando seja caso disso), “telhar” um pretendente a entrar na Loja, que tem de ser interrogado por sinais, palavras e toques, para constatar, pelas suas respostas, se ele é mesmo maçon e se o seu grau corresponde ao grau para o qual trabalha a Loja. Para isto, é necessário que o Guarda do Templo conheça todos os membros da sua Loja, todos os sinais, todas as palavras de passe, todas as senhas e as peculiaridades de cada grau. É verdade que no Rito Escocês Antigo e Aceito, a competência para telhar é do Experto, e, na sua ausência, do Guarda Externo.
Não obstante, é hoje vulgar não haver Guarda Externo, sendo já relativamente frequente algumas Lojas prescindirem do Experto. Por outro lado, mesmo havendo Experto, pode este ter faltado e não ter havido irmãos em número suficiente para o exercício daquele cargo. Neste caso, a competência para aquela função cabe ao Guarda Externo, que tem de a saber executar.
Em todo o caso, posso
assegurar, por experiência própria, que a falta de experiência maçónica para o
exercício deste cargo necessita de um árduo trabalho para ser compensada e para
que o cargo possa ser exercido com a mínima competência. Ainda assim, se os
erros cometidos por este Guarda Interno fossem pequenos confettis que caíssem
para o chão, seria necessária uma vassoura no final de cada sessão para varrer
o Átrio do Templo.
A expressão “telhar”, que se
tem vindo a utilizar, é a tradução do nome dado ao Guarda do templo nas
diversas línguas, sempre em sinónimo de “telha”. Em inglês, “tiler” (de tile);
em francês ”tiler” de tile); em italiano, “tegolatore” (de tegola). Na verdade,
na maçonaria operativa o Templo era fechado, no final da sua edificação, pondo-se lhe as telhas, e verificando-se que a construção ficava assim abrigada
de que, no seu interior, não penetrassem, água, humidades ou quaisquer
impurezas. Se o Templo não ficava bem coberto com as telhas a água entrava. É
por isso que estando um profano infiltrado entre irmãos dizemos “chove”. Se
chove no Templo significa que este foi mal “telhado”, ou seja, mal coberto. Porque
cobre o Templo, o seu Guarda é também chamado “Cobridor”. E por extensão,
cobrir o Templo passou também a significar “sair”.
Como em tudo na Maçonaria,
há por vezes dúvidas em relação ao cumprimento do ritual em relação àquilo que
nos parecem contradições. Apurei que há Lojas do nosso rito em que o Guarda do Templo
não participa na Cadeia de União com o argumento de que não pode abandonar o
seu lugar, deixando o Templo sem proteção.
A esta dúvida responde PEDRO
JUK de forma aparentemente sensata: se a cadeia de união ocorre após o
encerramento, senão dos trabalhos, pelo menos da ordem do dia, a Loja já não
está aberta em laboração, pelo que nela participa também o cobridor, seja ele o
Guarda Externo, quando exista, seja ele o Guarda Interno, quando nessa função.
Deve, portanto, formar-se a Cadeia de União após o fecho da Loja, ou pelo
menos, da Ordem de Trabalhos, depois de o Orador já ter tirado as conclusões da
sessão.
O Guarda Interno, ou mais
propriamente o seu lugar em Loja, também tem outro significado simbólico. É
consensual o entendimento de que os oficiais se situam, perfeitamente, nos
braços de uma estrela de seis pontas, ou “Selo de Salomão”, o Venerável e os
dois Vigilantes formando o triângulo ascendente, ou o Triângulo da
Espiritualidade e o Orador, o Secretário e o Guarda do Templo formando o
triângulo descendente, ou o Triângulo da Materialidade. Deste modo, no vértice
superior, o Venerável representará o Espírito, e no vértice inferior o Guarda
do Templo representa a matéria densa do corpo físico. Espiritualidade e materialidade.
Uma dúvida que se põe é como essas espiritualidade e materialidade se
comunicam. Para comunicar que o Templo está coberto o Guarda Interno comunica
com o Primeiro Vigilante, visto que essa verificação é o primeiro dever deste
em Loja. Porém, se batem à porta, deverá o Guarda Interno informar o Venerável
Mestre diretamente? Parece que não. Se para pedir a palavra não só o Guarda
Interno como qualquer obreiro tem de o fazer pelo Vigilante da sua coluna, para
aquela incidência também o Venerável Mestre terá de ser informado através do respetivo
Vigilante, neste caso o Segundo. O Venerável, por sua vez, é que tem o direito
de lhe responder como entender – diretamente ou através do segundo Vigilante –
porque esse é um seu privilégio regulamentar, não sendo necessária a
complicação adicional que por vezes existe e que eu vi assim escrita: “O
Venerável comunica-se com o Guarda do Templo por meio do Segundo Vigilante,
significando isto que o Espírito não atua diretamente na matéria densa do corpo
físico, senão que por intermédio da inteligência influi no duplo etérico,
embora uma vez realizada a investigação, a mente possa influir no duplo etérico
para que comunique o assunto diretamente ao espírito. Para simbolizar isto, há
em algumas Lojas o costume de dizer o segundo Vigilante, ao dar a ordem: Irmão
Guarda do Templo, vede quem solicita a entrada e comunicai-o ao Venerável”.
Meus queridos Irmãos sei que
por minha natureza não sou tão exotérico quanto desejaria, mas estes
teosofismos não me quadram e não creio que não se possa ser um bom maçon
prescindindo de tais zelos, tão ciosamente preservados. No meu caso,
garanto-vos que aceitei e exerço com humildade o cargo de Guarda Interno, mas recuso-me
a ser o “duplo etérico”, seja lá isso o que for.
Em todo o caso, a Maçonaria
é isto mesmo, é ousar, é sobretudo ousar pensar diferente, desde que para
aperfeiçoamento pessoal e na procura de progresso para todos e de harmonia para
o Mundo.
Para terminar, gostaria de
partilhar que encontrei referências a algumas práticas que nunca vi na nossa
Loja, mas que me pareceram adequadas. Por exemplo: batendo um obreiro
maçonicamente à porta (três pancadas), se o Cobridor não lhe puder
imediatamente dar ingresso responderá com outras três pancadas no lado interno
da porta. Deste modo, o obreiro do lado de fora compreenderá que está a ter
lugar um acto demorado (uma votação ou a leitura duma prancha) e não ficará na
dúvida acerca se foi ouvido.
Outra novidade, para mim, foi a forma como há quem anuncie que o Templo está coberto. No caso de haver Guarda Interno e Guarda Externo, aquele bate pelo lado interno da porta, respondendo-lhe estepelo lado externo. Dados estes sinais, o Guarda Interno faz a comunicação ao Primeiro Vigilante. Na situação de não haver Cobridor Externo, o Interno, na oportunidade, de espada empunhada, faz a verificação abrindo a porta e averiguando a situação no átrio. De retorno, ele fecha a porta e dá na mesma a batida com o punho da espada na porta, antes de comunicar com o Primeiro Vigilante. Trata-se de um sinal simbólico, que indica que a sua resposta foi precedida do cumprimento do respetivo dever.
Assim me venho preparando,
com estas pesquisas, para o exercício do meu cargo, e agradeço aos Meus
Queridos Irmãos que tenham partilhado comigo estas considerações.
Autor: Bocage
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