Desde que iniciei com a ajuda dos meus Q:. I:. o caminho para a
Luz fui incentivado a observar e absorver o decorrer dos trabalhos nas sessões
em Loja, tendo atenção ao Ritual, aos Cargos, participando no que me é possível
e sempre que solicitado.
No inico do meu percurso numa das nossas confraternizações um dos
nossos irmãos sugeriu que um tema que um dia pediria a um A:.M:. ou C:.M:. que
viesse a acompanhar seria o tema Silêncio, tendo desde essa data esse tema
ficado latente nas pesquisas e leituras que fui encontrando e fazendo a minha
reflexão.
A primeira questão com que me deparei e que numa primeira fase
pareceria mais simples, não o foi. O que é isto do Silêncio? É estar calado? Ou
mais que isso?
Recorrendo-me de um dicionário verificamos que si·lên·ci·o provém do latim silentium e é um substantivo masculino que define o estado de quem se abstém ou para de falar, a cessação de som ou ruído, a interrupção de correspondência ou de comunicação, a omissão de uma explicação, o sossego, quietude, calma, o segredo, sigilo, o Toque nos quartéis e conventos, depois do recolher e frequentemente utilizada a palavra como interjeição numa expressão usada para impedir de falar ou pedir que alguém se cale.
Definida a palavra, importa detalhar de forma semiótica a mesma
para perceber a sua significação na relação com a Maçonaria. Neste processo de
análise levantam-se duas questões que para mim e no trabalho que tenho
desenvolvido no desbaste da pedra bruta como A:. e no polimento como C:. têm
significados distintos:
- O que é o Silêncio Maçónico?
- O que é Silêncio em Maçonaria?
Começando na demanda da primeira questão, a interrogação remete-me
para o significado associado ao Silêncio de Segredo. O nosso Q:.I:. António
Arnaut define a nossa A:.O:. como “ discreta” e não secreta já que nada tem a
esconder e os Rituais podem ser facilmente encontrados num qualquer
alfarrabista, assim é reservada já que por ser iniciática não está aberta ao
público e reserva apenas aos M:. o conhecimento de certas práticas e saberes, o
que poderá ser considerado o segredo maçónico. Como exemplo de não sermos uma
associação secreta temos as recentes eleições em que mutos nos nossos I:.
tiveram conhecimento dos resultados na imprensa e não pela nossa A:.O:.
Podemos claro considerar que a Maçonaria como associação de homens
livres, de bons costumes, onde seus membros se dedicam ao aperfeiçoamento moral
e social através do trabalho constante já foi alvo de diversas perseguições com
consequências graves para todos os M:. pelo que a manutenção do Segredo sobre
as praticas da Maçonaria eram uma questão de sobrevivência.
Actualmente no caso de Portugal, se podemos considerar que não é
fisicamente uma ameaça ser M:., pode ser ainda prejudicial profissionalmente,
esta situação é causada pelo desconhecimento e preconceito que o mundo profano
tem da nossa A:.O:. e será também aqui importante a nossa acção diária nos
nossos actos com Cidadãos e até como G:.O:.L:. para desmistificar esses
preconceitos junto do mundo profano o quanto baste para assumirmos o nosso
papel tantas vezes esquecido e muitas vezes manchado pela má conduta de alguns
M:. ou pela calunia sobre terceiros utilizando a nossa A:.O:. até como uma arma
contra um nosso I:. ou profano que até poderá nunca ter sido iniciado.
Vivendo num mundo em constante mutação e com equilíbrios por vezes
muito frágeis é importante também manter uma forte vertente discreta para que
não seja dado por garantido que não teremos de nos manter vigilantes para a
necessidade de estarmos sempre preparados a retornar a práticas mais
Clandestinas ou apoiar essas mesmas práticas nos locais onde a Republica e a
Democracia estão postas em causa ou já não exista para que não se percam os nossos
valores fundamentais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Finalmente e ainda sob a ideia de Segredo temos o nosso juramento
que não divulgaremos o que se passa na nossa A:.O:., em todas as sessões
prometemos ao nosso V:.M:. não revelar a M:. ou profano algum o que se passou
na sessão, o que não serão apenas palavras lidas num Ritual, pois este nosso
compromisso é um dos alicerces da nossa união. É nesta componente do Segredo
Maçónico que pela confiança mutua exercitamos a nossa fraternidade pelos símbolos,
hábitos e costumes que partilhamos e ensinamos aos I:. que a Loja acolhe no seu
seio.
Então e além do Segredo Maçónico o que poderá ser igualmente o
Silêncio em Maçonaria?
Reflectindo sobre esta questão o meu pensamento vai para o silêncio
quase absoluto em que o A:.M:. e o C:.M:. estão confinados nas sessões, o que
numa primeira análise não seria uma pratica muito Maçónica pois não estão num
patamar de igualdade para com os I:.M:.M…
Para compreender esta discrepância na utilização da palavra fui
relembrar o conceito de A:.M:., C:.M:. e M:.M:. socorrendo-me das definições
dadas pelo nosso Q:. I:. António Ventura:
A:.M:., - “Titulo do 1 grau de todos os ritos maçónicos. Representa
aquele que começa a aprender, o “estagiário”, o Homem na sua primeira infância,
carente de protecção, apoio e ensino que trabalhará no desbaste da «Pedra
Bruta», de forma a conhecer-se a si próprio e a libertar-se progressivamente
dos preconceitos da vida profana”.
C:.M:. – “Titulo do 2 grau de todos os ritos maçónicos. Já está
suficientemente instruído para poder acompanhar o mestre na maioria dos
trabalhos. Representa o homem na sua juventude espiritual, com iniciativas, mas
ainda pouco consciente das virtualidades que possui” (…) “Trabalha
simbolicamente no polimento da «pedra bruta», já desbastada pelo aprendiz.”
M:.M.. – “Titulo do 3.º grau de todos os ritos maçónicos. Já possui
faculdades para trabalhar por si e para ensinar os outros. Representa o homem
maduro, consciente das suas responsabilidades. Só neste grau o maçon atinge a
plenitude, pode intervir na Loja, eleger e ser eleito para todos os cargos.”
Lendo estas três definições sou imediatamente remetido para o
desenvolvimento cognitivo entre o profano e o M:.M:.
Este desenvolvimento inicia-se na Câmara de Reflexões, na iniciação
onde uma da inscrições contem as letras V.I.T.R.I.O.L., estas além de darem o
nome a uma Associação paramaçónica, significa Visita Interior Terrae
Rectificando que Invenies Occultum Lapidem (Visita o Interior da Terra e
Rectificando Encontrarás a Pedra Oculta). Aqui somos transportados para uma
certeza, temos de meditar sobre nós próprios e nessa introspecção encontrarmos
um exercício que não cessará. Iremos de forma constante procurar formas dentro
de nós mediante as experiências que temos de nos melhorarmos como indivíduos e
consequentemente como grupo.
Esta perspectiva remeteu-me para as diversas teorias existentes de desenvolvimento
sendo que das leituras que fiz a que me pareceu mais alinhavada com o meu
pensamento sobre o tema foi a Teoria Cognitiva, esta apesar de já ser datada
para alguns estudiosos do tema, ajuda-nos a perceber a nossa forma de
aprendizagem cognitiva pois surge na década de 50 com um complemento das
teorias comportamentais em que a aprendizagem era apenas efectuada por condicionamento,
ou seja estimulo-resposta.
Assim, na teoria cognitiva vemos a definição do termo cognição como
o conjunto de habilidades mentais que desenvolvemos para a construção do nosso
conhecimento do mundo. Os processos cognitivos envolvem, portanto, as
capacidades relacionadas ao desenvolvimento do pensamento, raciocínio, fala,
introspecção etc, tendo inicio na infância e estando directamente relacionados
com a aprendizagem.
Não pretendo nesta prancha detalhar as diversas correntes
cognitivistas defendidas por Piaget, Wallon e outros, pois cada uma delas é
digna de um trabalho académico para o qual confesso não tenho formação
adequada, no entanto apesar das diferenças entre estas correntes todas procuram
compreender como a aprendizagem ocorre no que se refere às estruturas mentais
do sujeito e sobre o que é preciso fazer para aprender, num processo de
construção de um esquema de representações mentais que se dá a partir da
participação activa do sujeito e que resulta na transformação em conhecimento.
Assim e transpondo este processo de aprendizagem para a Maçonaria
temos no silencio uma ferramenta fulcral. Estamos no processo de nascer de novo
para o mundo, de nos contruirmos novamente e iniciamos assim o processo de
caminhar para o conhecimento, o que se faz primeiro por observação depois por
repetição e finalmente ao desenvolver o nosso trabalho, podemos fazer aqui um
paralelismo com os três primeiros graus maçónicos e os diferentes estágios da
aprendizagem da infância à idade adulta tão patente nas viagens da iniciação. Verificamos
assim que o silencio em maçonaria é mais que não falar, não é na verdade sequer
ser proibido de falar, é ter o direito a ouvir atentamente e meditar sobre o
que foi ouvido, num exercício disciplinado que nos permite como A:. e C:. M:.
ver coisas que posteriormente teremos menos disponibilidade para ver.
Anteriormente referi que têm surgido questões ao longo do meu
caminho no desbaste da pedra bruta como A:.M:. e no polimento como C:.M:., o
mesmo sucederá aos M:.Q:.I:. M:.M:. pois todos nós procuramos a verdade num
caminho que será eterno. Orgulhosos todos por em determinados momentos nos
silenciamos na contemplação dos reflexos da Luz que nos motiva e fortalece os
nossos propósitos pois no trabalho estarmos todos os dias um dia mais perto da construção
de um Mundo mais justo e perfeito.
Finalmente deixo-vos com uma consideração sobre este tema que me
parece pertinente remetendo para a definição de M:.M:. “só neste grau o maçon
atinge a plenitude”, pois bem, tal e qual como no mundo profano, sendo o A:.M:.
e o C:.M:. remetidos aos silencio não estão efectivamente num patamar de
igualdade para com os I:.M:.M:., estão sim num patamar que se poderá dizer até
superior pois num gesto de grande fraternidade estes permitem que os primeiros aprendam
e evoluam, tendo mais tempo para conseguir contemplar os reflexos da Luz antes
de se dedicarem ao trabalho e ensino dos I:. que os seguem.
Na Maçonaria silenciar-se é ouvir.
Autor: Armindo Matias
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