José Liberato Freire de Carvalho, nasceu na Quinta de Monte São, freguesia de S. Martinho do Bispo, próximo de Coimbra, em 20 de Julho de 1772, era filho do Dr. Aires António Antunes Freire, Mordomo-Mor da Universidade de Coimbra, e de sua esposa Maria Joaquina Freire de Carvalho.
Por influência de seus pais, mas também de seu irmão D. António da Visitação Freire de Carvalho, ingressou em 1787, com 15 anos de idade, na Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, no Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra, onde estudou Filosofia e Teologia, contudo manteve-se atento ao que acontecia na Europa, nomeadamente aos ecos da Revolução Francesa, através do contacto com um seu irmão frade do Convento de Grijó.
Sem particular vocação para a vida monástica, pediu e obteve transferência para o Mosteiro de Refoios do Lima, um ambiente bem menos disciplinador.
Terminados os estudos teológicos em 1795, recebeu em Braga as primeiras Ordens Sacras, sendo oficiante D. Frei Caetano Brandão, e adoptando o nome religioso de D. José do Loreto.
Permaneceu no Mosteiro de Refoios do Lima, até ao ano de 1800, ano em que foi nomeado professor de Lógica na escola anexa ao Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa.
Esta nomeação foi conseguida por influência de seu irmão D. António da Visitação Freire de Carvalho, que era ali professor.
Chegado a Lisboa ganhou acesso à excelente biblioteca do Convento de São Vicente de Fora, estabeleceu contactos com a melhor da intelectualidade da época, tendo privado, entre outros, com Gomes Freire de Andrade, Bento Pereira do Carmo e Manuel Maria Barbosa du Bocage.
As suas ideias libertárias levaram-no a integrar-se nos círculos pró-liberais e maçónicos, filiando-se na Loja Fortaleza do Grande Oriente Lusitano, onde significativamente, adoptou o nome simbólico de Spartacus.
Nos anos imediatos, dedicou-se com afinco aos estudos filosóficos, lendo os autores contemporâneos e desenvolvendo as suas capacidades intelectuais. Para além da Lógica passou a ensinar Retórica e Eloquência. Este processo foi interrompido em 1804 pela doença e morte do seu irmão D. António da Visitação, vítima de uma pneumonia. Este acontecimento causou-lhe grande consternação e obrigou-o a uma estadia com familiares em Coimbra e na Figueira da Foz, onde fez uma cura de banhos de mar.
Regressado a Lisboa, assumiu as funções de Grande Orador do Grande Oriente Lusitano, que entretanto se organizara para enquadrar as Lojas maçónicas existentes.
Em 21 de Novembro de 1804 foi feito sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa, sucedendo no lugar ao seu falecido irmão, contudo, a sua permanência em Lisboa foi curta, pois o seu relacionamento com Hipólito José da Costa, acabou por atrair as atenções da Santa Inquisição e foi obrigado a abandonar o Mosteiro de São Vicente de Fora e recolher-se no Mosteiro de Grijó, em cujo Convento permaneceu até 1808, exilado por ordem da Intendência da Polícia de Lisboa, apesar das inúmeras diligências feitas junto dos poderes políticos e mesmo junto do Príncipe Regente D. João.
Desencadeada a Guerra Peninsular com a invasão de Portugal pelas tropas francesas e tendo ocorrido a transferência da corte portuguesa para o Brasil (1808-1821), foi finalmente autorizado a regressar a Lisboa, onde encontrou o Mosteiro de São Vicente de Fora a servir de alojamento a numerosos oficiais franceses.
Conhecedor da língua francesa, teve um papel importante no relacionamento entre a Ordem e as autoridades de ocupação francesas, relacionamento este, que criou a fama de ser pró-francês, razão pela qual após a Convenção de Sintra, o obrigou a procurar refúgio junto dos seus familiares em Coimbra, onde permaneceu até 1810, alegando doença, ano em que, por ser membro da maçonaria foi incluído na lista dos presos da “Setembrizada” em que foram embarcados e desterrados para a Ilha Terceira, contudo ficou impedido de regressar a Lisboa temendo ser preso e deportado.
No entanto após a Batalha do Buçaco foi feito refém em Coimbra pelas forças do general Massená e forçado a acompanhar o exército francês até Pombal e Condeixa, conseguindo em finais de Março de 1811 fugir aos seus captores quando pernoitava em Foz de Arouce.
Pouco tempo depois foi preso e encarcerado na Prisão da Universidade de Coimbra, acusado de ter acompanhado os franceses, após ter sido libertado passou a viver com os seus familiares em Coimbra, mas pouco tempo depois volta a ser preso por ordem da Regência do Reino e colocado incomunicável no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra até 1813, aproveitando o tempo a fazer uma tradução portuguesa dos Anais de Tácito.
Em Agosto de 1813, sem nunca ter sido julgado, foi mandado para o Mosteiro de Refoios do Lima e proibido de contactar qualquer pessoa fora da comunidade de frades que ali habitava.
Quando passava pelo Porto a caminho do Mosteiro, por sugestão e com a ajuda de José Pinto Basto, recebeu um passaporte passado em nome de um pretenso criado de um negociante inglês e com ele chegou à Corunha onde embarcou com destino a Londres.
Na Corunha havia recebido um novo passaporte passado pelo Cônsul Britânico, escolhendo então o nome de José Liberato Freire de Carvalho, nome que conservaria para o resto da vida. A adição do nome de Liberato marcou a sua alforria, que acompanhou pelo abandono dos títulos eclesiásticos, considerando-se daí em diante desobrigado dos seus votos e do nome de D. José do Loreto.
Em Londres dedicou-se ao jornalismo e em 1814 passou a ser redactor de “O Investigador Português em Inglaterra”, um periódico de grande influência entre os emigrados portugueses no Reino Unido e mesmo junto das elites portuguesas. Quando o Duque de Palmela pretendeu fazer do periódico o órgão oficial do governo português no exilio, recusou, o que levou á suspensão da comparticipação que o mantinha. Fundou então o Campeão Português, um periódico que ganhou extrema importância durante o período que antecedeu a Revolução Liberal do Porto.
Após a implantação do regime liberal em Portugal, chegou a Lisboa em 1821, sendo convidado para ingressar na carreira diplomática. Não aceitou, optando por um lugar de adido no Ministério dos Negócios Estrangeiros, cargo que manteve por pouco tempo. Entretanto reingressou no Grande Oriente Lusitano, adoptando o nome simbólico de “Camarino Dirceu” .
Fundou em Lisboa o periódico que intitulou de O Campeão Português em Lisboa, manifestando grande independência editorial. Nele deu voz ás suas criticas ás circunstâncias que haviam conduzido a independência do Brasil e ao papel que nelas tivera o Príncipe D. Pedro de Bragança, futuro D. Pedro IV.
Feito deputado para as Cortes de 1822-1823, pelo círculo de Viseu, tendo prestado juramento em 22 de Novembro de 1822. Contudo na sequência da Vilafrancada foi enviado para a sua casa da Quinta de Monte São, em São Martinho do Bispo, com residência fixa. Foi indultado em 1824, mas recusou qualquer participação na vida política até 1826. Retomou o lugar no Ministério dos Negócios Estrangeiros e foi nomeado redactor da Gazeta de Lisboa, órgão oficial do governo português.
Com a subida ao poder do Rei D. Miguel, foi obrigado a passar á clandestinidade , mantendo-se assim até 1828, ano em que conseguiu regressar ao exilio em Londres, dedicando-se ao jornalismo e assumindo um papel determinante na mobilização dos emigrados liberais em Inglaterra no período inicial da Guerra Civil (1828-1834. Passou depois na companhia de Saldanha, a Paris, tendo integrado as forças liberais que vieram a reforçar os liberais sitiados no Porto, onde chegou em princípios de 1833.
Terminada a Guerra Civil, regressou a Lisboa, onde foi nomeado 2º. Grão-Mestre Interino do Oriente de Saldanha, ou Grande Oriente Lusitano da Maçonaria do Sul, de aliança “Saldanhista”, cargo que exerceu nos anos de 1834-1835. Em 1835 passou a ser membro da Sociedade Patriótica Lisbonense. Simultaneamente foi eleito deputado ás Cortes pelo círculo da Madeira para a legislatura que começou em 15 de Agosto de 1934 e terminou a 4 de Junho de 1836. Nesta legislatura destacou-se na discussão da lei de liberdade de imprensa, recusando a interferência dos poderes públicos no jornalismo e foi encarregado de redigir o Auto de Exclusão de D. Miguel.
Até á Revolução de Setembro de 1836, foi arquivista da Câmara dos Pares do Reino, sendo nomeado por Passos Manuel, presidente da Comissão Administrativa da Imprensa Nacional, cargo que exerceu até 1838. Após a revolução, foi eleito deputado ás Cortes Constituintes (1837-1838) pelo círculo de Lisboa, tendo participado activamente na discussão da Constituição Portuguesa de 1838, votando com a fracção mais radical.
Apesar de ter sido eleito deputado pelo círculo de Lisboa para a legislatura de 1838-1840, a partir de 1838 retirou-se progressivamente da vida pública, dedicando-se ás letras e á Academia Real das Ciências de Lisboa, de que foi um dos mais assíduos académicos. Ainda Assim, subscreveu com outros deputados setembristas, uma proposta de lei visando alterar a lei eleitoral vigente.
Destacando-se pela sua independência e desapego aos bens materiais, rejeitou todas as prebendas e vantagens que lhe foram oferecidas tendo morrido pobre em Lisboa aos 82 anos de idade, no dia 31 de Março de 1855.
Deixou uma vasta obra histórica, política e autobiográfica, sendo considerado como um dos principais ideólogos do primeiro liberalismo português, particularmente pela sua influência sobre a imprensa durante a fase da emigração liberal para Inglaterra e França.
Autor: Fernando Valle
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