sexta-feira, 23 de abril de 2021

A Humildade

“Acredito que o primeiro teste de um grande homem é a sua humildade. Não quero dizer com humildade, dúvida do seu poder. Mas os grandes homens têm um sentimento curioso de que a grandeza não é deles, mas por meio deles. E eles vêm algo divino em todos os outros homens e são infinitamente, totalmente e incrivelmente misericordiosos” – John Ruskin, 1819 - 1900.

Humildade, do latim humilis, o pequeno, o que está perto do húmus, isto é, do chão. Para Aristóteles, a virtude que conduz o indivíduo à consciência das suas limitações. Segundo a Bíblia, consiste em ter-se consciência das próprias limitações, ser manso e humilde de coração (Jo. 1, 16), não se apropriando dos dons e pondo-se ao serviço de todos, sendo a virtude oposta ao orgulho e a soberba, naquilo que em Maçonaria se costume esconder sob o título de eterno aprendiz.

É a característica que define uma pessoa modesta, alguém que não acredita ser melhor ou mais importante do que os outros de forma alguma. É a ausência de arrogância. Estabelecemos como ponto de partida quanto ao seu significado, o conhecimento das próprias fragilidades e limitações; bem como minimizar conquistas e virtudes, reconhecendo falhas e erros.

Para a colocar no quadro filosófico, cito brevemente a conceção díspar de humildade de Immanuel Kant, que afirmava: “a humildade é a virtude central da vida ao fornecer uma perspetiva apropriada sobre a moralidade” e Friedrich Nietzsche que, em contraste, considerou que a humildade “é uma falsa virtude que esconde as deceções de uma pessoa”. Para Nietzsche, a humildade ia contra o impulso vital.

Como tal, surgem-me algumas reflexões interessantes e de aparentes contradições, como o fato de que uma pessoa humilde deixa de o ser quando a autoproclama.

Do ponto de vista da evolução espiritual, a humildade é uma virtude do realismo, pois consiste em ter consciência das nossas limitações e inadequações e em agir de acordo com essa consciência. Mais exatamente, a humildade é a sabedoria de quem somos. Em outras palavras, é a sabedoria de aceitar nosso nível evolutivo real.

António de Oliveira Marques a define como característica maçónica, ligada a aprendizagem e ao aperfeiçoamento constante de todo obreiro, qualquer que seja seu grau. Na Maçonaria, parte-se do princípio de que todos têm a aprender com os seus irmãos e de que o convívio em loja, independente de quaisquer diferenças de idade, classe ou profissão, é um dos meios mais úteis dessa aprendizagem. A humildade aparece simbolizada em vários atos rituais, do primeiro ao último grau. Liga-se em parte, aos princípios da disciplina e da obediência que regem toda a organização maçónica e que não devem ser confundidos com despotismo e tirania 

Portanto, a humildade é o requisito imprescindível de todo aquele que percorre o Caminho Iniciático na busca da Verdade, pois grande parte da disciplina desse Caminho, baseia-se na consciência da limitação do seu saber, buscar ativamente e preencher-se em virtude dessa falta.

Em geral, a humildade é considerada como algo positivo, embora em sociedade se verifique que as nossas coberturas e conversas mediáticas não são feitas por pessoas humildes. 

A humildade não é algo que se encontre num estado natural nos homens, em vez disso, aparece exclusivamente num contexto social.

Se aprofundarmos a sua existência real, a reflexão que nos proporciona é que talvez o que realmente está subjacente a ela seja a empatia, a capacidade de se colocar na posição de outro ser e consequentemente ter consideração pelos seus sentimentos e emoções. O humilde não festeja com ostentação as conquistas para não ferir a sensibilidade de quem ficou na estrada. Antes sim, como princípio universal da maçonaria, estende a mão ao semelhante.

As qualidades gerais que contribuem sobre pessoas humildes é que são pessoas que não falam de si mesmas, não invejam, não se gabam.

Na sua obra "A Genealogia da Moralidade" Nietzsche argumenta sobre a origem da moralidade cristã, por meio da análise do contexto histórico e da psique humana, que o cristianismo não nasce do amor ao próximo, mas sim que sua gênese está no profundo ressentimento e ódio que os fracos têm pelos poderosos.

A humildade passa por maus bocados na nossa sociedade, em grande medida porque é uma qualidade incompreendida pela maioria das pessoas. As pessoas pensam nisso como um desprezo deliberado pela própria capacidade, uma abnegação que ignora o talento e a realização.

Não é!

Humildade é o ato de ter a Sabedoria de se retirar do centro do universo e reconhecer que os outros merecem amor tanto quanto nós. É a capacidade de fazer solicitações e não demandas, pois uma demanda é uma forma de dizer “Eu sou mais importante do que vós”. Um maçom não deve fazer essa afirmação, porque somos todos Irmãos, vivendo no Nível, onde nenhum homem é mais importante do que outro. 

A mente humilde é recetiva por natureza e, portanto, está mais disposta a ouvir e apreender. No caso oposto, há a mente arrogante que, por saber muito sobre algum assunto, se acredita capaz de discernir assuntos sobre os quais não conhece nem mesmo os princípios mais básicos, acreditando que está preparado para fazer julgamentos válidos sobre coisas que não tem a mínima ideia. Nessa falta de reconhecimento dos limites do seu saber, o arrogante constrói sua ilusão de ser mais importante que os outros.

O sucesso em servir aos outros vem da humildade; quanto mais humildes, maiores conquistas obteremos. Não pode haver benefício para o mundo sem humildade. Quando expressamos uma opinião, devemos fazê-lo com o coração e a mente abertos para aceitar as particularidades, força e sensibilidade de nós mesmos e dos outros.

Dizem, que uma vez um Aprendiz perguntou a um Mestre qual era a chave para se tornar um verdadeiro Maçom. Ele respondeu que estava no triplo "C", ou seja, Compromisso, Constância e Consciência. 

O Aprendiz perguntou: porque então havia tão poucos maçons verdadeiros, ao que o Mestre respondeu: que muitas vezes aqueles que entraram na Maçonaria procuraram satisfações materiais que os afastaram do caminho; que títulos bombásticos e reconhecimentos mal interpretados desencadearam os desejos descontrolados do Ego. O Mestre acrescentou, que à medida que se avança no caminho para a Luz, esses apetites são vencidos e o supérfluo desaparece, restando no final a simplicidade e a humildade, que conduzem ao serviço da Humanidade.

Ser Maçom é ensinar com responsabilidade e generosidade. Se temos de fazê-lo, se somos discípulos, aprender com humildade, sempre observando o princípio de ouvir e estar em silêncio.

A humildade é uma das virtudes exigidas ao maçom. A Maçonaria considera o homem como um ser imperfeito, o qual trabalha a pedra bruta com o estudo dos símbolos para se aperfeiçoar e irradiar as suas realizações para o mundo exterior. 

Portanto, a Maçonaria aceita a vaidade como situação de imperfeição, e à medida que a pedra é polida diminui em favor da Humildade, desde que não vá a extremos que a tornem uma imperfeição. É o que acontece com a falsa humildade, que é a pretensão de ser menor do que realmente sabemos que somos.

A Maçonaria deveria fechar as portas, a quem transfere do mundo profano, as suas ambições, soberba e vícios para a esfera da Ordem contaminando-a.

Para terminar, cito um pensamento de Cícero Rodrigues:

“O inútil vive de ódio; o hipócrita vive de mentiras; o idiota vive de ignorância, mas o humilde vive de amor, verdade e sabedoria”


Autor: Viktor Frankl

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